Ira nuclear é um problema mundial

Vice-cônsul sobre Irã

  •   Irã nuclear é um problema mundial, não só de Israel
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    Ao iG, Amit Mekel defende que Brasil reforce pressão contra programa nuclear iraniano e reitera laços fortes de relação com EUA

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     : Divulgação
     
     
    Com o argumento de que o programa nuclear do Irã é uma ameaça ao mundo, e não só a Israel, o vice-cônsul de Israel em São Paulo, Amit Mekel, defende que o governo brasileiro de Dilma Rousseff reforce as iniciativas da comunidade internacional para impedir que o país persa adquira armas atômicas.
    "Se o Brasil tem um bom canal de comunicação com o Irã, esperamos que o utilize para conversar com suas autoridades e dissuadi-las", disse em entrevista ao iG o druso Mekel, o primeiro diplomata israelense no Brasil que não é judeu.
    Questionado se a ameaça de Israel de atacar o Irã não poderia isolar mais o país no Oriente Médio e em relação ao governo americano de Barack Obama, que em ano eleitoral vem pedindo que se dê mais tempo para que as sanções tenham efeito, Mekel é conciso. "Em discurso (em 4 de março), Obama reafirmou que todas as opções estão sobre a mesa em relação ao Irã e que Israel e os EUA têm laços inquebráveis."
    Falante de hebraico, inglês e árabe, o vice-cônsul chegou ao Brasil em dezembro depois de servir no Egito, de onde teve de partir com sua família após a invasão da Embaixada de Israel no Cairo em setembro, sete meses após a queda do egípcio Hosni Mubarak em meio à Primavera Árabe.
    Sobre as consequências que os levantes populares contra autocracias do Oriente Médio e do norte da África terão na região e em Israel, Mekel é cauteloso. "Estamos em um momento em que precisamos de paciência, em que só podemos esperar pelo melhor na região. Tudo é muito novo. E a escolha do que fazer será dos países árabes."
    Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista que concedeu ao iG.
     
    iG: Em 2010, o Brasil tentou mediar uma solução para o impasse sobre o programa nuclear do Irã, mas não obteve sucesso. Qual papel o Brasil poderia desempenhar agora?
    Amit Mekel: O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, disse diversas vezes que Israel não aceitará um Irã com armas nucleares. Esse é um problema mundial, não só de Israel. Nesse sentido, esperamos que o Brasil, que é um país importante no mundo, una-se aos esforços da comunidade internacional para evitar que Teerã adquira armas atômicas.
     
    iG: Desde que Dilma assumiu a presidência, há sinais de distanciamento na relação entre o Brasil e o Irã. O senhor concorda com isso?
    Mekel: Essa é uma questão privada do governo brasileiro. Mas se o Brasil tem um bom canal de comunicação com o Irã, esperamos que o utilize para conversar com suas autoridades e dissuadi-las de obter armas atômicas. Brasil e Israel vêm cooperando em vários setores, e esperamos que nossa relação continue crescendo. Temos boa cooperação em questões econômicas, culturais. Na semana passada, o vice-chanceler israelense, Danny Ayalon, visitou o País. Com a Copa do Mundo em 2014 e as Olimpíadas em 2016, esperamos que aumente o número de companhias israelenses aqui, que hoje atuam nas áreas de comunicação, segurança, agricultura, tecnologia.
     
    iG: Não seria fácil para Israel lançar um ataque contra as instalações nucleares do Irã sem a ajuda dos EUA. Apesar disso, Israel sempre declara ter o direito de adotar uma ação unilateral contra o Irã. Ao fazer isso, Israel não arrisca ficar mais isolado no Oriente Médio e também prejudicar sua relação com os EUA?
    Mekel: Em discurso no Comitê de Assuntos Públicos Estados Unidos-Israel (Aipac, na sigla em inglês), Obama reafirmou que todas as opções estão sobre a mesa em relação ao Irã. Também reafirmou que Israel e os EUA têm laços fortes, inquebráveis. Isso é o que falarei sobre esse assunto.
     
    iG: Sim, Obama sempre diz que a opção militar não foi descartada, mas este é um ano eleitoral, e uma ação militar agora é vista como potencialmente prejudicial à sua campanha de reeleição. A pressão israelense não seria prejudicial para a relação dos dois países?
    Mekel: Não podemos pressionar os EUA. Sempre se fala da força da comunidade judaica nos EUA, mas não podemos forçar o país a fazer o que não quer.
    iG: No dia 14, o Azerbaijão disse ter prendido 22 supostos espiões contratados pelo Irã para lançar ataques contra embaixadas de Israel e EUA. Em fevereiro, Netanyahu culpou o Irã e o grupo libanês Hezbollah pelo ataque a um carro diplomático israelense e por uma ação frustrada na Géorgia. Há temores de planos similares contra alvos de Israel na América Latina, incluindo o Brasil?
    Mekel: Há um sentimento de medo por esses fatos recentes, que primeiramente aconteceram na Tailândia. Mas confiamos na polícia federal brasileira.
     
    iG: Apesar do distanciamento em relação ao Irã, o Brasil tem uma política de apoio à causa palestina e no ano passado apoiou a tentativa frustrada do presidente Mahmud Abbas de tentar o reconhecimento de um Estado palestino na ONU.
    Mekel: O único caminho para se alcançar um Estado palestino é por meio da negociação direta. O premiê israelense defende a solução de dois Estados e reiterou essa posição em seu discurso na ONU no ano passado. Ele foi o primeiro-ministro de Israel a congelar as construções dos assentamentos por dez meses (no território palestino da Cisjordânia, entre novembro de 2009 e setembro de 2010), convidou Abu Mazen (apelido pelo qual é conhecido o presidente palestino) para dialogar pessoalmente em qualquer lugar de sua escolha. A secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, reconheceu que Netanyahu fez várias tentativas para conseguir a negociação. Durante os últimos anos, Israel fez várias propostas de paz que foram rechaçadas pelos palestinos.
     
    iG: Houve o congelamento, mas as construções na Cisjordânia foram retomadas, e a suspensão completa da expansão dos assentamentos é a principal condição dos palestinos para retomar as negociações.
    Mekel: Os assentamentos nunca foram obstáculo para a paz. Israel negociou a paz com o Egito e retirou seus militares e civis da Península do Sinai em 1979 (território ocupado durante a Guerra dos Seis Dias de 1967), depois da assinatura dos acordos de Camp David. Também alcançamos a paz com a Jordânia em 1994. Retiramos os assentamentos e os militares da Faixa Gaza em 2005. Então a única solução é a negociação direta. Mas não concordamos com o acordo de reconciliação entre o Hamas, que é considerado terrorista por parte da comunidade internacional, e a Autoridade Palestina de Abbas. Só  aceitaremos o Hamas na mesa de negociações quando aceitar o direito de existência de Israel,  desarmar-se, parar de defender a jihad (guerra santa), como fazem em seu manifesto, e aceitar os Acordos de Oslo de 1993.
     
    iG: Mas essa posição de confronto do Hamas contra Israel não seria reforçada pelo bloqueio a Gaza e o uso de força desproporcional em retaliação ao lançamento de foguetes a partir de Gaza contra o sul de Israel?
    Mekel: O que se faria aqui se houvesse lançamento de foguetes, se 1 milhão de pessoas pudessem ser atingidas? Acho que a população daqui gostaria que fosse usada a maior força possível para impedir esses tipos de ataques. Quanto ao bloqueio, a ONU reconheceu que ele é legal no ano passado, já que o objetivo é evitar que o Hamas se arme e ataque Israel.
     
    iG: Com a Primavera Árabe, as coisas mudaram para Israel no Oriente Médio. No caso do levante sírio, apesar de o presidente Bashar al-Assad ser aliado do Irã e do Hezbollah, o regime mantém a fronteira tranquila desde 1973 mesmo com a ocupação israelense das Colinas do Golan. Qual seria o impacto de uma eventual destituição de Assad para Israel?
    Mekel: É uma nova era no Oriente Médio, em que esses países lutam pela democracia em um processo difícil. Na Síria, é inacreditável a quantidade de mortos, e a comunidade internacional não vem conseguindo fazer muita coisa. Israel já ofereceu ajuda humanitária, como alimentos, medicamentos. Mas não há como prever o que acontecerá. No Egito, por exemplo, não havia como antecipar que (Hosni) Mubarak cairia em tão pouco tempo. Mas não sabemos o que acontecerá no Egito, quem será o novo presidente, quem será o novo chanceler. Israel está comprometido em manter o tratado de paz, e a Irmandade Muçulmana e os salafistas já declararam que também têm esse objetivo. Mas estamos em um momento em que precisamos de paciência, em que só podemos esperar pelo melhor na região. Tudo é muito novo. E a escolha do que fazer será dos países árabes.
     
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